O paulistano
Toninho Ferragutti lançou A gata Café (Borandá), seu décimo álbum. Compositor,
arranjador e um de nossos maiores acordeonistas, ele e seu instrumento se
juntaram a outros quatro músicos para criar o Toninho Ferragutti Quinteto:
Cássio Ferreira (sax), Vinícius Gomes (guitarra e violão), Thiago do Espirito
Santos (baixo) e Cléber Almeida (bateria).
Partindo da
formação instrumental do grupo e das dez músicas escolhidas para compor o novo
disco, todas de sua autoria, Ferragutti definiu a estética musical que
imprimiria nos arranjos (todos dele) e no modo de tocá-los. O resultado, então,
foi uma sonoridade brasileira enriquecida em sua diversidade rítmica e
melódica, inspirada no jazz e em suas raízes negras, sua harmonia e seu swing.
Os temas do CD
são ricos em melodias e em levadas. Isso graças a arranjos generosos, seja em
compassos para improvisos e uníssonos, seja nos duos de Toninho (acordeom) e
Cássio (sax), ou de Vinícius (guitarra) e Thiago (baixo) – todos apoiados pelo
pulso de Cléber (bateria), o que resulta num som brasileiro de qualidade.
O gênero diverso
das composições de Ferragutti permite aos instrumentistas, de acordo com suas
próprias concepções, revelarem o que está nas partituras à sua frente: todos
muito inventivos, com uma virtuose expandida por sua jovialidade. A sonoridade
resultante é fruto da arregimentação inicial concebida por Ferragutti e,
principalmente, de seus arranjos e de seu instrumento.
Em algumas de
suas regiões sonoras, o acordeom tem grande proximidade e afinidade com o som
do sax, quando este se vale de sons médios da escala. Se cada duo dos dois
instrumentos já resulta num encantamento, este só aumenta quando eles tocam o
frevo “Bipolar”, que soa como um naipe de sopros frevando numa ladeira de
Olinda. É, repito, a formação instrumental do quinteto, bem utilizada nos
arranjos, que nos permite pressentir essas “viagens” sensoriais.
Outro exemplo?
Quando a guitarra e o sax tocam em uníssono no início de “Santa Gafieira”,
seguido de um improviso supimpa do acordeom, quase dá para sentir o cheiro de
tabaco e álcool rescendendo do salão, onde os pares rodopiam.
Mais um? Em
“Cortejo do Rio do Peixe”, diante de um solo da guitarra, com acordeom e baixo
triscando as notas, podemos fantasiar o ruído dos passos numa rua qualquer do
interior.
Outro? “Beduína”,
quando Cléber (bateria), com viradas e levadas ligeiras, e o acordeom entoando
a melodia nos permitem sentir que estamos num imaginável oásis, em meio a um
desértico areal.
E mais outro?
“Egberto”, quando Toninho Ferragutti resfolega no acordeom, tornando
contagiante a pegada nordestina e fazendo-nos imaginar um bailão sob o luar do
sertão, com os casais calçando suas alpercatas de couro e levantando poeira do
chão.
Toninho
Ferragutti, compositor contemporâneo, é um acordeonista que estabeleceu um
retrato de rara beleza da musicalidade brasileira.
Aquiles Rique
Reis, músico e vocalista do MPB4
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De JORNAL DE
BRASÍLIA, 28/07/2016
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