Sunday, October 1, 2017

A Literatura de Suassuna

GABRIELA BLENDA

O que torna um escritor conhecido? Criar personagens inesquecíveis. Produzir uma obra original e complexa. Ser agitador cultural. Representar o contexto social no qual emerge. Ter sua obra adaptada para TV e cinema. Ser traduzido para outros idiomas. Falar sobre as questões da natureza humana. Defender a língua vernácula. Ter uma vida que serve como fonte de inspiração para seus fãs. Essas características costumam percorrer a trajetória de escritores notoriamente consagrados, incluindo o homenageado neste texto: Ariano Suassuna.

Este autor tornou-se, no imaginário coletivo, sinônimo do Auto da Compadecida. A popularidade dessa obra deve-se, sobretudo, à comicidade das personagens. Se por um lado Suassuna deu vida a tipos jocosos e populares como João Grilo e Chicó, por outro idealizou a complexidade de Dom Pedro Quaderna. Esse personagem, que divide a narração entre lembranças e delírios, permite ao escritor explorar a bagagem da cultura sertaneja e nordestina aliando heranças ibéricas.

Ariano disse que entre todas as suas obras, se apenas uma pudesse ser salva, deveria ser Romance d’A Pedra do Reino e o príncipe do sangue do vai e volta, por considerá-lo o livro que mais lhe representa enquanto escritor. O universo mítico que permeia essa obra é um sertão transformado pela imaginação e reminiscências da infância de Ariano na cidade de Taperoá. Essa obra foi apelidada por Ariano como romance armorial-popular brasileiro, se tornando símbolo literário do Movimento Armorial; criado por ele e outros artistas da música e artes plásticas, o movimento tinha o objetivo de reunir a erudição das manifestações da cultura popular.

O romanceiro, romance popular de origem ibérica perpetuada no nordeste pelos folhetos de cordel, influenciou Suassuna, assim como as iluminuras dos monges medievais. Inspirado nesses desenhos da Idade Média, o autor criou as iluminugravuras, desenhos que ele cria para ilustrar seus livros.

O sertão e a tradição popular são ambientes da literatura de Ariano. Isso contribui para o interesse da parcela da população que até então não sentia identificação com o conteúdo apresentado no teatro e nos livros. Colocar em suas obras elementos da cultura nordestina traz para a produção cultural do país uma nova perspectiva sobre o que pode servir de base para a literatura.

A literatura suassuniana trabalha com os gêneros dramático, romance e ensaio; suas peças de teatro foram publicadas como livro e adaptadas para as telas de TV e cinema.

Apesar da relutância do autor em sair do país, suas obras foram traduzidas e/ou pesquisadas na França, Estados Unidos, Alemanha, Portugal, entre outros. Já que a língua portuguesa e a cultura brasileira foram a motivação de Ariano enquanto escritor, ele não teve interesse de aprender outra língua e visitar outra pátria. Este posicionamento, inclusive, rendeu-lhe fama de radical e o envolveu em polêmicas.

Suassuna apropria-se de expressões da natureza humana – amor, cobiça, avareza, traição, astúcia – e mostra o lado picaresco do ser humano, os conflitos morais, a relação humana com os santos…

Ariano Suassuna fez mais pela literatura brasileira do que duas páginas permitem contar. E existiria um vão nos palcos e prateleiras da cultura nacional caso suas obras não fossem encenadas e publicadas. Sem as personagens criadas por ele, haveria silêncio no lugar de risos. Ariano é inspiração para todo brasileiro que deseja contar histórias sobre a sua origem, ou reinventá-las. Ariano Suassuna foi escritor, professor e defensor da literatura brasileira e da cultura popular.

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De FEMININO E ALÉM, 29/08/2016


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